Pular para o conteúdo principal

Cartas a Tás (57 de 60) Amas tua terra?



Ituverava, 19 de outubro de 2009.
Olá caro amigo! Esta nossa terra possui mesmo encantos bastante incomuns aos olhos dispostos a apreciar a exuberância da natureza como um todo, em contraste com as construções urbanas.
Ontem tivemos chuva por aqui. É sempre incrível quando chove em nossa cidade após alguns dias de intenso calor.
Nossas primaveras são sempre assim; faz um calor que beira o insuportável, depois há uma mudança repentina no humor do clima, venta forte; e em grande parte das vezes caem volumosas gotas de chuva; trata-se de uma chuva esparsa, e de curta duração, mas às vezes, conforme ocorreu ontem, após grande ventania sobrevém água em abundância, num furor de vento e gotas aglomeradas a formar pequenas placas que arrebentam nas telhas, paredes, asfalto e janelas mornas. À noite o clima que beirava o insuportável torna-se deveras agradável. Uma deliciosa brisa fresca, com cheiro de terra úmida, perdura após o cessar da chuva e pela manhã temos um sol brilhante sobre o asfalto, o que confere um frescor cheio de luz e contrastes. Como bem sabe é este um espetáculo de rara beleza, amigo.
Estes dias são ótimos para uma corrida ao final da tarde. E com o horário de verão é possível, com sorte, para nós árduos trabalhadores, uma corrida ainda sob a luz do dia. Se corrermos pela Av. Dr. Paulo Borges e atingirmos uma parte alta da cidade, ao final do asfalto da ruazinha do parque permanente de exposições, por exemplo, teremos uma vista fabulosa: o céu exibe vários tons em azul, indo de mais tênue, claro á mais firme e intenso, tudo em perfeita harmonia com a alvura das nuvens, pinceladas como que ao acaso. Abaixo do céu, em toda direção que se olhe, encontramos uma elevação discreta que circunda toda cidade. Esta elevação é forrada por várias tonalidades de verde, e a terra nua não é observada facilmente nesta época do ano devido à viril fertilidade de nosso solo. Abaixo do cinturão verde vemos a pequena cidade caprichosamente assentada sobre o asfalto, suas ruas, sua arquitetura agradável, multiforme e modesta, sua variedade de cores, retratam a diversidade social e as épocas e tendências da construção civil.
Fato a lamentar é que resta pouco da Ituverava que nos viu crescer, mas ainda assim é um grande privilégio a visão desta pequena morena de pele avermelhada.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Sr. e o Dr.

Ao ser levado à presença daquele Sr de seus maturados 84 anos, estava na verdade indo rever um bom pedaço de minha infância. Afinal, aquele homem de baixa estatura, tórax roliço e finas pernas de passarinho era figura muito frequente nas ruas mais movimentadas de minha terra, há uns 20 anos. Vestido com um jaleco branco sentava com boa postura em sua “motoquinha”, percorria toda cidade com seu jeito lépido. Mas agora ele se encontrava muitos anos à frente daqueles dias; e já não mais conservara sua autonomia para o “ir e vir” a toda parte. Pior ainda, naquele momento sofria com a recuperação de uma fratura no fêmur, ocorrida após uma queda dentro de sua própria casa. _Quão dura é a realidade do ancião que de andar dentro do próprio lar, pode quebrar-se ao chão, isso quando não se quebra de pé, sem mais nem menos, indo apenas posteriormente ao solo, ao que chamam de fratura espontânea. Mas retornemos ao nosso “continho”. Dia após dia, sessão após sessão, meu novo amigo ancião, recuperav...

É Primavera

Era uma manhã de setembro quando o velho Alincourt chegou diante do belo lago de minha cidade, estacou sobre um terreno baldio sito à margem direita, ergueu ao alto os dois braços com ambos os punhos cerrados e vibrou de modo indescritível. No punho esquerdo o velho trouxe uma porção de terra em pó, poeira formada por noventa dias de estiagem. Ao abrir aquela mão, os vigorosos ventos de setembro levaram consigo a terra, que se desprendia e esvaía pelos ares, formando uma fina nuvem de poeira vermelha a andar no ar. O céu tornara-se vermelho, assim como a própria terra do lugar. Da mesma mão desprenderam-se folhas secas. Incontáveis folhas em tonalidades marrons, beges, amarelas. Um enorme urubu, atraído por um odor propagado pelo vento, passou a oferecer uma sombra circular sobre a cabeça do velho. Após a primeira ave, vieram outras da mesma espécie. Em pouco tempo eram seis, vinte e duas, trinta e cinco, cinqüenta e uma, mais de cento e três. Os ventos anunciaram uma carcaça canina...

O Diário de Bronson (10 - O Chamado)

_Bronson, o tal Dr. Mendelson ligou para você. Disse para retornar o mais depressa possível. O que esse homem teria para falar de tão urgente? _Não sei, Frida. Na verdade nem imaginava que ele pudesse querer um dia falar comigo. _Você vai ligar? _Claro. Por que eu não ligaria? _Sei lá. É que você voltou tão pra baixo após a última consulta. _Não era uma consulta, era um aconselhamento; e isso não tem nada haver com os meus humores. _Ta bom. Esqueça. Não disse nada. ... _Alô! Dr. Mendelson? ... _Sim, Doutor. Eu posso. Já estou a caminho.... _Onde vai, Bronson? _Vou até a casa do Dr., me parece que sofreu um acidente e, fraturou a perna, precisa falar comigo. _Você agora virou enfermeiro? _Frida, por favor, não comece! _Desculpe, mas... Bronson! Bronson! Bronson havia partido ao encontro de Dr. Mendelson. Em dez minutos já estava diante da casa amarela com fachada de arquitetura mista (antiga/contemporânea). Apertou o interfone e desta vez não ouviu a fria voz de Crisostemo; ao invés des...