É claro que naquele lugar sempre haveria separação entre pessoa e pessoa. Tudo ali era o mais puro e sólido embuste. Vendiam a imagem das superioridades e impunham gratuitamente a das inferioridades, como quem defende a qualquer custo uma mentira travestida em absoluta verdade. E ai de quem questionasse aquela pompa! Pompa pobre, é verdade; porém deveras pomposa.
Não foi fácil ver mais uma vez a doce Adele humilhar-se por tão pouco. O que ela ganharia ali além do ingresso àquele circo de convenções bizarras por mais uma noite enfadonha? Um prato com salgados frios e um bolo de glacê insípido e amanteigado? Era preciso entender por que afinal de contas Adele se sujeitava a partilhar tão triste espetáculo fornecendo àqueles seres a substância que alimentava toda falsa caridade que exerciam em socorro do desafogo da própria consciência permissiva.
Abriram uma porta e, com todo desdém de que foram capazes, deixaram que Adele adentrasse o recinto. Ela veio com aquele sorriso sofrido e de difícil manutenção. Trazia à mão um pequeno embrulho por oferenda. Era pequeno o embrulho como eram pequenas as finanças da moça e o alcance de seu poder de consumo. A anfitriã tomou o minúsculo pacote e fez uma boca torta dizendo algo que vinha carregado de uma proposital e nítida decepção premeditada e irônica.
É. Em certas horas seria melhor não estar no local, seria melhor até mesmo nem existir ali, mas que se há de fazer quando ali está e ali existe? O jeito é tocar em frente para ver até onde vai a truculência alheia. E Adele saiu de sua casa perfumada e no melhor traje que lhe fora possível, o que, a bem da verdade, não era lá grande coisa diante à boca torta da anfitriã cheia de adereços extravagantes, inadequados à ocasião singela.
Adele se uniu ao grupo e fruiu das horas que mesclavam uma viva alegria por estar entre pessoas que tanto queria bem e uma fria tristeza por estar entre pessoas que não sabiam simplesmente querer bem sem aproveitar o ensejo para exercitar seus frívolos jogos de distinção e tosca encenação.
Era estranho como a anfitriã entortava sua boca fálica cada vez maior no ângulo inferior dos lábios à direita de quem a encarasse. Com o tempo, seus lábios tornaram-se bolsas intumescidas que sacolejavam enquanto ela falava coisas tortas e presumíveis, porém ininteligíveis. E ninguém dizia à ela que sua boca estava torta e sua fala era cada vez menos compreensível. Afinal, não era uma característica natural em sua família aquela boca torta. De onde teria saído aquilo? Aliás, ninguém na família de origem da mulher possuía boca torta. Todos eram dotados de finos e comportados lábios alinhados horizontalmente e dispostos a sorrir por qualquer besteira lançada pela vida.
A única explicação para tamanha resignação de Adele não era outra senão seu imenso apego aos laços afetivos. Se em algum momento teve algo que a uniu àquela mulher da boca torta, acontecesse o que acontecesse, passasse o tempo que passasse, Adele continuaria fiel em atenção, carinho e frequência.
Era mórbido o gosto que a mulher da boca torta tinha em sempre ficar exibindo seus lábios pendentes diante a cálida figura de Adele. E soturna também era a ausência de espírito que arrastava Adele toda vez que era chamada para aquelas estranhas convenções. Um filósofo justificaria tudo dizendo que a soberbia precisa da humildade assim como um equino não prescinde de seu capim. Mas quem é que precisa da opinião dos filósofos quando ambas as partes concordam em participar com seus papeis em um estranho e nebuloso espetáculo?
Gostei bastante do texto e da forma como você se expressa! Essa coisa de boca torta vai ficar um tempo ainda na minha imaginação! ahah (:
ResponderExcluirÉ bem como a sociedade vive.
ResponderExcluirParabéns!
É Amigo,
ResponderExcluirAssim É A Vida;
Uma Eterna Representação De Nós Mesmos;
Onde Os "Tortos" E Os Esteticamente "Perfeitos(!?!!)",
Dividem O Palco Até O Fim,
Sem Dele Poder Fugir.
Muito bom o texto...abraços e boa semana
ResponderExcluirSutil impressão da vida,quem nunca ouviu palavras tortas de bocas tortas e de pessoas tortas...brilhante.Um abraço.
ResponderExcluirMarcia Silveira
Jefh, obrigada por apresentar-me seu blog escrito de maneira tão especial... Quando crescer quero escrever igual à voce. beijos
ResponderExcluirJeferson, tudo bem?
ResponderExcluirObrigada por ter visitado meu blog, é uma grande alegria ter sua opinião sobre meu trabalho! Adorei seus textos, você escreve muito bem, parabéns! Vou acompanhar sempre seu blog! Um grande abraço e valeu pelo carinho!
Seu texto é muito bom,gostei da maneira como você escreve.
ResponderExcluirAbraços e boa semana.
Olá Jeferson!
ResponderExcluirObrigada pela visita,o seu blog é muito bom, tem ótimos textos!Parabéns!
Abraços e uma boa semana!
Voltamos para casa, como trapezistas de um circo transformado.
ResponderExcluirE assim vamos tropeçando nos absurdos inventados pelos ideais corrompidos, por vaidade ou covardia...
Reinventamos crenças, e reviramos as gavetas, procurando as gravatas sem remorsos.
Questionamos, sem querer realmente saber as respostas.
Estamos sempre com a livre consciência que se submete e cala.
E artificialmente paralisados, vamos abrindo mão da nossa essência.
Nos disfarçamos dentro de tudo, em meio a todos,para nos sentirmos vivos!
http://www.copartecafe.com.br/2012/11/assim-caminhamos.html
Excelente a sua narrativa e a sua construção dos personagens!
Evidencia o sistema caótico em qual vivemos.
Grande abraço Jeferson
Que demais :)
ResponderExcluirAdoro o seu blog, parabéns e continue a escrever.
"Escrevendo a gente fala pra caralho" não é? (Caio F.)
http://raquelconsorte.blogspot.com.br/
Amei o seu texto, pois percebo o quão singela é a forma como você se expressa! Parabéns ^^
ResponderExcluirAbraços,
http://therevolucaonerd.blogspot.com.br/
Vom conhecer e gostei... Já fiquei!
ResponderExcluirAbraços!!!
obriga pelo comentário em meu blog, confesso que aquela pena frase me fez refletir muito e esse belíssimo texto me fez refletir ainda mais. beijão sempre que der apareço por aqui continue a escrever...
ResponderExcluirGOSTO DE LER SEUS TEXTOS, FICO SEMPRE QUERENDO SABRE MAIS....
ResponderExcluirOlá! Gostei muito do seu texto, a forma como você se expressa e também os adjetivos que usa. Além do mais, gosto de textos que me fazem refletir e esse é bem um deles. Inclusive, seu texto tem um pouco a ver com o que eu escrevi no meu blog - o qual você comentou e me me levou até o seu.
ResponderExcluirOLÁ JEFH CARDOSO VIM RETRIBUIR E AGRADECER A SUA VISITA, TEXTO PARA REFLETIRMOS SOBRE O PALCO QUE É A VIDA NÓS SOMOS OS AUTORES DESTE SHOW E UMA HORA O SHOW ACABA, E O QUE NOS VALERÁ A BOCA TORTA. A HUMILDADE PRECEDE A HONRA,ESTE TEXTO ME FAZ REFLETIR MAIS SOBRE A HUMILDADE QUE PRECISAMOS TER PARA QUANTO DESCERMOS DO PALCO.ABRAÇOS.
ResponderExcluirAdorei teu blog, digamos que achei inspirador! Parabéns, tens muito talento. Sucesso!
ResponderExcluirBeijo!
Bom dia!
ResponderExcluirTudo bem?
Vim agradecer a sua visita e pelo comentário deixado em meu blog,muito obrigada.
Quanto a sua pergunta se tem alguma explicação que no inverno nos vestimos bem, eu acredito que seja pelo fato de nos preocuparmos mais com combinação das peças,cores, texturas e assim ficarmos mais elegantes.
No verão nos vestimos de maneira mais despojada,não tem temos tanta preocupação assim.
Comentando sobre a sua postagem, tenho que ser sincera que ainda não dei a devida atenção a ela como merece, quero ler sua postagem com atenção, com carinho e ainda hoje o farei, apenas vim lhe responder para que você não pense por muito tempo que eu não vi seu comentário no blog.
Sou muito sincera e não faço rodeios, então....me aguarde que eu virei hoje ainda com mais tempo ler a sua postagem com muita dedicação.
Obrigada pelo carinho, obrigada pela visita!
Adoro os seus textos, eles retratam bem a vida...
ResponderExcluirAbraços
http://vaidadesdemenino.blogspot.com.br/
Olá! Obrigada por ter comentado no meu blog.
ResponderExcluirAs suas histórias são muito interessantes. Existem sempre nos pequenos povoadas do interior, aqui também, pessoas com determinadas características que são os bobos da festa!
Gostei da forma como redige os seus textos. Um abraço.
M. Emília
Boa noite Jeferson!
ResponderExcluirVoltei. Disse que voltaria não foi?
Cumpro com a minhas palavras.
Na verdade quero lhe parabenizar pelo texto e sinto que você é apaixonado por literatura.
Gosto de escrever, mas não sei como colocar as palavras nos lugares certos, ou seja,não sei escrever corretamente mas, admiro quem saiba.
Parabéns amigo.
Esta frase boca torta, ficou martelando em minha mente, pois quantas bocas tortas temos que enfrentar em nossas vidas e que as vezes é sim um teatro e as vezes é sim pura realidade.
Bocas tortas temos que enfrentar sempre, inclusive a nossa própria, pois as vezes nós mesmo deixamos que ela fique torta e deixamos nossa autoestima no chão.
Obrigada meu amigo,por ter me dado a oportunidade de estar aqui!
Obrigada!
Boa noite Jefh!!!
ResponderExcluirE essa mulher boca torta...fui lendo e até pensei que ela tivesse paralisia facial. Mas entendi ao final que não. Concordo com o final: ... "ambas as partes concordam em participar com seus papeis em um estranho e nebuloso espetáculo" e que sejamos felizes...
Tenha um domingo feliz e abençoado!!!
Abraços da Bia!!!
Obrigado pela gentil visita, e adorei sua página ejá estou seguindo. Abçs e uma semana repleta de paz, luz e proteção a todos nós...
ResponderExcluiré muito belo seu blog amei,beijos e sucessos.
ResponderExcluirBacana o texto Jeferson! E obrigada pela visita ao meu blog, http://miojinholit.blogspot.com.br/! ;)
ResponderExcluirAbraços!
A vida é cheia de surpresas. Algumas pessoas tem bocas tortas, outras, carater torto, e por ai vai. Saber lidar com cada um
ResponderExcluiré muito difícil, mas a vida é assim, uma surpresa atras da outra.. Agora ca entre nos Jeferson, eu jurava que vc era escritor!
texto muito bom e intrigante esse caráter "boca torta" peço licença a vc para divulgaçao deste texto com os devidos créditos claro, tenho a impressao que os alunos ficariam encantados com um texto tão surpreendente!
ResponderExcluirOi, Katia! Fique à vntade. Ficarei muito honrado. Um abraço!
ExcluirParabéns pelo texto. Obrigada pela visita ao meu espaço. Gostaria de convida-lo a retornar, Recebi uma classificação(de 1 a 5), fiquei com 4,4 num contexto de blogs com diversos temas e interesses. O meu blog diz respeito a área da Saúde. Esta classificação representa um Prêmio pela qualidade dos blogs classificados.A listagem com a classificação se encontra no meu Blogspot http://marialopesetemastransversais.blogspot.com.br/2013/03/estou-compartilhando-classificacao-do.html,
ResponderExcluirWebsites fortemente relacionados com Marialopesetemastransversais.blogspot.com
O índice é realizado por similaridade com vistantes entre vários sites,. Obrigada por sua visita.Maria Lopes.-Rio de Janeiro.
"É. Em certas horas seria melhor não estar no local, seria melhor até mesmo nem existir ali, mas que se há de fazer quando ali está e ali existe? O jeito é tocar em frente para ver até onde vai a truculência alheia."
ResponderExcluirsimplesmente, fabuloso!
Olá Jefh!
ResponderExcluirGostei bastante do texto viu!
Boca fálica? Pobre Adele...
Fico aquí imaginando com seria essa tal "boca fálica" viu!
Para Francisco Brennand, seria então uma obra fálica de arte!
abs,